
Peru enfrenta o desafio de conter o crescente negócio da extorsão

Motoristas de ônibus são baleados e explosivos detonados em frente a comércios e escolas. A extorsão floresce em Lima, em meio a uma polícia peruana que afirma não ter capacidade para desmantelar o negócio mais lucrativo do crime organizado.
Em um modesto prédio na capital peruana, o coronel Roger Cano e sua brigada de 50 membros aprimoram suas táticas antiextorsão no Cone Norte, considerada a área mais perigosa de Lima, com quase três milhões de habitantes.
Este é um crime "fácil de cometer e difícil de combater", disse o oficial à AFP.
Sua missão é atacar o cérebro do crime, despojando-o de seus "recursos logísticos e humanos": capturar o assassino de aluguel ou "atirador", apreender a dinamite, enquanto agentes de inteligência, em uma abordagem "mais silenciosa e paciente", perseguem os chefes e suas finanças.
É mais fácil extorquir do que roubar um banco. "Eles não correm riscos, não mostram o rosto, não enfrentam a polícia diretamente", acrescenta.
A extorsão se espalhou tanto no Peru que é considerada um desafio comparável ao tráfico de drogas — o Peru é o segundo maior produtor mundial de cocaína, segundo a ONU — ou às guerrilhas de esquerda nas décadas de 1980 e 1990.
E também tem um forte impacto social e psicológico, pois a vítima permanece em contato com o agressor: ela é extorquida diariamente, semanalmente ou mensalmente, observa o cientista político Eduardo Moncada, autor do livro "Resistindo à Extorsão: Vítimas, Criminosos e Estados na América Latina".
Com apenas um celular, um extorsionário pode invocar um grupo criminoso e gerar medo, observa.
- Lacuna tecnológica -
As autoridades detectaram seis tipos de extorsão, incluindo "chalequeo" (segurança em troca de dinheiro), cotas (pagamento pela realização de uma atividade econômica) e gota a gota (empréstimos com juros altos).
Esta última modalidade prospera no emprego informal, que no Peru chega a 73%. Sem acesso ao crédito bancário, os trabalhadores informais recorrem a extorsionários.
O objetivo do coronel Cano é atacar as gangues emergentes antes que elas "tomem o centro do palco". Mas enfrenta várias dificuldades. Por exemplo, as operadoras de telefonia não respondem rapidamente aos pedidos de geolocalização de celulares usados em chantagens.
As autoridades também carecem de equipamentos de rastreamento de comunicações. A lacuna tecnológica "nos deixou um tanto encurralados", disse à AFP o coronel Franco Moreno, chefe da divisão geral de investigações contra sequestros e extorsão.
No entanto, mais do que isso, pesa a desconfiança dos cidadãos em relação ao Estado, afirma o professor Moncada, da Universidade de Columbia. E o medo de que as autoridades possam estar "em conluio com o crime organizado (...) que as está extorquindo".
- Mutação -
Com 10 milhões de habitantes, Lima é o núcleo da extorsão e dos protestos contra a insegurança. O governo impopular de Dina Boluarte enviou militares às ruas desde março para reforçar as operações policiais.
Mas condições "excepcionalmente favoráveis" à extorsão persistem no país, incluindo um Executivo "fraco" e "incapaz" de combatê-la eficazmente, observou a Human Rights Watch em um relatório publicado em julho.
Em Lima, houve pelo menos 102 homicídios por extorsão em 2024. Mototaxistas e motoristas foram as principais vítimas, segundo o Indaga, um observatório afiliado ao Ministério da Justiça.
Seguiram-se comerciantes, engenheiros civis, barbeiros, taxistas, líderes comunitários e trabalhadores da construção civil.
"O sentimento de medo está aqui e não vai embora", disse à AFP, sob anonimato, uma comerciante de roupas cuja casa foi recentemente atacada com explosivos em Lima. Os extorsionários exigiram aproximadamente 8.400 dólares (R$ 45.588 na cotação atual).
Em todo o país, as denúncias aumentaram de 2.396 em 2023 para 15.336 em 2024, um aumento de 540%. Lima liderou a lista.
A extorsão sofreu uma mutação, alerta o coronel Moreno. "Eles não negociam mais, não há acompanhamento, atacam você de frente com dinamite (...) e depois te chamam."
Organizações como Los Pulpos, La Jauría, Los Injertos del Norte ou Tren de Aragua, de origem venezuelana, são sinônimos de medo e silêncio.
Nem mesmo as escolas escapam. Pelo menos 500 centros de ensino foram extorquidos entre janeiro e abril no Peru, segundo o coletivo Educar con Libertad.
V.Pyo--SG